Escrito
por ALLAN FEAR
CAPÍTULO
1
Era uma noite fria,
sombria, com uma lua cheia brincando de esconde-esconde atrás das opressoras
nuvens que pairavam baixas nos céus.
Raios
azulados faiscavam nos céus, enquanto trovões ferozes, como rugidos de algum
animal furioso, explodiam ecoando na calada da noite.
Já
era a hora morta, a meia-noite que apavora os crédulos e supersticiosos. A hora
em que as lendas diziam que criaturas hediondas e terrores negros escapam de
suas covas para vagar pela terra.
Paulo,
um rapaz já na casa dos 30, havia acabado de deixar o bar. Dirigia feliz seu Taurus
preto sob o efeito de alguns copos de cerveja, seguia pela Rota 666.
Era
noite de sexta e mesmo não sendo um criminoso, Paulo infligia as leis de trânsito
ao dirigir embriagado. Isso já havia se tornado um hábito havia algumas semanas.
Paulo
se achava sóbrio, alegre apenas, dera algumas dezenas de tragadas daquela
cerveja gelada, amarela, coberta por espuma branca. Mesmo após uma parada para
bebedeira num bar local, ele ainda estava indo para uma festa a convite de um
amigo. Ia sozinho em seu carro, o pé parecia pesar no acelerador enquanto os
faróis altos rasgavam a escuridão silenciosa da rodovia deserta, como um par de
olhos luminosos rasgando as trevas da noite.
Paulo
se sentia vivo, agradava-lhe a brisa suave que adentrava o vidro meio aberto da
janela agitando seus cabelos pretos como a noite. A brisa suave e úmida trazia
o perfume de dama da noite.
Os
pneus do Taurus cantavam ao derraparem ruidosamente nas curvas acentuadas. Um
aglomerado de árvores ladeava a sinuosa estrada de mão dupla. Paulo sentia sede.
Ansiava por mais algumas cervejas geladas. Pisava fundo para chegar logo a
festa que prometia alegrar sua noite que estava apenas começando.
Mas
então Paulo começou a sentir uma forte necessidade de se aliviar, porém sabia
que ainda faltavam uns 20 minutos para chegar a festa que ficava do outro lado
da cidade.
Paulo
decidiu então parar naquela estrada deserta e se aliviar ali mesmo entre as árvores
e arbustos que a ladeavam. Ele diminuiu a velocidade do carro em uma curva e
parou de forma imprudente na pista, puxou o freio de mão e saiu às pressas do
veículo.
Após
se aliviar, Paulo notou uma luz estranha no interior da floresta. Ele andou
sorrateiro, intrigado com aquela luz azul fantasmagórica que brilhava no
interior da mata.
O
que poderia ser? Por que se sentia atraído a ela como mariposas para uma
lâmpada acesa?
CAPÍTULO 2
Paulo caminhou devagar,
esmagando folhas e gravetos sob seus pés. O ar ficou pegajoso e úmido no
interior da mata. Seu coração dava saltos no peito a medida que ele se
aproximava da estranha luz.
Paulo
passou por entre arbustos altos e parou atrás de uma grossa árvore. Inclinando-se, ele ergueu a cabeça para
espiar o que estava acontecendo ali.
Instantaneamente
seus olhos foram tomados por horror. Um arrepio gelado se espalhou por todo seu
corpo. Suas pernas ficaram trêmulas e moles como gelatina. Seus olhos
contemplavam um pavor inumano. Os dentes se debatiam em sua boca. O pobre rapaz
estava incrédulo diante de algo aterrador.
CAPÍTULO
3
Paulo não conseguia
raciocinar, não podia pensar, era por demais assustador o que seus olhos fitavam.
A simples visão macabra assolava seu espírito e estremecia seu coração.
Sem
pensar, sem coragem para articular alguma palavra, o aterrorizado rapaz começou
a fugir daquele horror. Primeiro ele cambaleou para trás e então começou a
correr por sua vida. Nada havia que ele poderia fazer senão fugir, fugir para
bem longe, levando consigo memórias insanas do mais hediondo horror.
Mas
então quando Paulo chegou ao patamar da floresta ele congelou, pasmo ante uma
visão de devastação.
Paulo
olhava para seu carro destruído, arruinado. Mais a frente um caminhão com o
para-choque destroçado.
Paulo
não conseguia raciocinar, as cenas do horror mudo dentro da floresta ainda
perturbavam sua mente. Então ele viu o condutor do caminhão. Era um homem de
meia idade, que usava uma longa barba espessa e um boné de beisebol azul. O
homem andava de um lado para outro, angustiado, desesperado.
Paulo
tentou acalmá-lo, dizendo que precisavam dar o fora dali, havia algo inumano na
floresta. Mas o homem não o ouviu e quando Paulo se aproximou de seu carro
enxergou um corpo dilacerado lá dentro.
CAPÍTULO
4
Paulo
olhou com horror e nojo ao ver o corpo arrebentado ao volante do Taurus. Era
tão jovem, tinha uma vida toda pela frente e tudo foi perdido.
Então Paulo ouviu
o rugido emanar da mata e se voltou para lá. Ele viu aquela coisa assustadora
envolta em uma fantasmagórica luz azul fosforescente vindo para pegá-lo.
Paulo olhou novamente para o corpo sem vida no Taurus e
depois para o desesperado motorista do caminhão e soube que, diante de tais
circunstância tudo que ele poderia fazer era possuir o corpo do velho caminhoneiro
e dar o fora dali antes que aquele devorador de almas o tragasse.
Paulo sabia bem como possuir corpos humanos e assim o
fez, metendo-se dentro do corpo do motorista de caminhão que se contorceu
compulsivamente quando uma força sobre-humana se atrelou em sua nuca
enlouquecendo seu sistema nervoso central.
Paulo se sentiu vivo novamente ao tomar o corpo do
caminhoneiro, subiu no caminhão e deu a partida e alegrou-se quando o veículo
pegou e voltou para a Rota 666 pisando fundo no pedal do acelerador.
Paulo sentia falta do corpo jovem daquele rapaz que ele
havia possuído, o qual ele estava usando já havia algumas semanas. O corpo do
velho não o sustentava corretamente, mas serviria até que achasse outro e o
salvou de ser devorado por aquela coisa estranha que sempre o estava
perseguido.
Enquanto acelerava o caminhão cujo vidro frontal estava
todo trincado, Paulo sentia a garganta seca, estava louco por mais longos
tragos de cerveja. Era tão bom estar vivo novamente, mesmo que fosse em um corpo
de outra pessoa com o espírito dela gritando e lutando para se libertar.
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