https://www.youtube.com/watch?v=PoBidLYdFp4&t=9s


Escrito por ALLAN FEAR



CAPÍTULO 1

Era um dia quente de verão, acordei cedo, tomei uma ducha e engoli um café quente e forte. Isso sempre anima meu dia, sentia falta da minha velha, a minha pobre esposa que Deus a tenha.
            Meu nome é Clóvis Ernesto, já estou na casa dos 65 e o que vou contar é algo bem estranho que me aconteceu há exatos 3 dias.
            Passei um pente para dar um jeito nos fios de cabelo brancos que circulavam minha careca e ganhei a rua. Era dia de vacinação para idosos ou, pé na cova, como Harold, um amigo já na casa dos 71, costumava dizer. Eu odeio filas, por isso me levantei bem cedinho e foi para o centro médico.
            Eu residia em uma cidade do interior Paulista chamada Ariranha, que tinha quase uns 10 mil habitantes. Quando era mais jovem eu vivia nas grandes cidades e olha onde vim parar.
            Foram uns 5 minutos de caminhada até o centro médico. Cheguei e aguardei abrirem os portões. Uma pequena fila se formou atrás de mim, composta em sua maioria por lavadeiras que falavam como maritacas e que adoravam dizer como a vida estava uma merda, como os maridos as tratavam mal, a velha ladainha da porra. Eu só bufava qualquer coisa e elas achavam que eu estava dando a mínima para a merda de suas vidas.
            Por fim um jovem segurança abriu os portões e eu adentrei o centro médico. Fui o primeiro a ser atendido, entrei numa sala pequena e a enfermeira, gorda como uma porca, terminou de ingerir seu café da manhã, um grande pão de sal com linguiça e um copo de suco de laranja, ela sorriu para mim exibindo seus dentes amarelos. A pele era clara e o nariz pontudo sempre me lembrava uma grande ratazana gorda. É, eu sei, sou um tanto quanto rabugento, mas depois de certa idade a vida fode mesmo com você e eu andava sempre irritado depois que a minha esposa morreu há uns 2 anos.
            A enfermeira, que usava um jaleco meio encardido abriu o lote de vacinas e tirou uma ampola, espetou uma agulha e absorveu o líquido amarelado, muito parecido com urina.
            -Não vai doer nadinha Sr. Clóvis- Garantiu ela, achando que eu fosse a porra de um moleque. -É como uma...
            -Aplica essa merda logo! - bufei carrancudo; -Já tomei tanta injeção que nem sinto mais nada, também pudera, a pele do meu braço tá igual à do meu saco.
            Ela murmurou algo e aplicou a vacina no meu braço. Não senti a picada, não senti nada.
            Mas quando me levantava para ir embora, todo o meu corpo começou a se debater em uma convulsão intensa, eu não conseguia me controlar, babava e me debatia compulsivamente até que, por fim, estatelei no chão e tudo ficou escuro como breu.


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CAPÍTULO 2

            Não sei por quanto tempo perdi os sentidos e fiquei desmaiado, só me lembro que de repente recobrei a consciência, mas não podia me mexer, estava com todo o corpo paralisado.
            Eu estava deitado, isso eu sabia, mas não conseguia me mexer, meus olhos estavam fechados, tudo era um breu desgraçado.
            Então prestei atenção e percebi que havia pessoas ao meu redor, choramingando, sussurrando, murmurando. Eu tentava falar, mas não conseguia.
            -Que diabos está havendo porra? – por fim a voz saiu de minha boca e pude me mover e então ouvi coros de gritos apavorados.
            Olhei ao redor e vi meus amigos, meus parentes, como a tia Dalva e o primo Tomás, e percebi onde eu estava. Era uma sala com coroa de flores, pessoas vestidas de preto. Eu estava deitado em um caixão. Isso mesmo, os filhos da puta estavam me velando, já preparando para me enterrar.  Um coroa não pode desmaiar que já pensam que empacotou.
            Nunca xinguei tanto, bati o recorde de palavrões, atirei as flores de defuntos em cada um deles, Tia Dalva caiu dura no chão ao me ver saindo do caixão.
            Deixei-os lá, assustados, incrédulos, apavorados e voltei para minha casa. Meu estômago roncava de fome. Uma fia chuva de verão salpicava a rua.
            Cidade do interior é uma porra, você não pode nem desmaiar que já querem te enterrar, a sorte é que não tenho nem um centavo senão já teriam dividido tudo entre eles.
            Em casa tirei um frango assado da geladeira e o devorei em minutos ainda frio. Fui para o banheiro me livrar daquela sensação de defunto, aquela estranheza desagradável, tinha a impressão de que tinha mergulhado em uma piscina de formol e fedia a hospital, precisava de um banho.
            Mas quando entrei no banheiro e olhei no espelho eu vi que tinha algodão no meu nariz. Os tirei, estranhando que não havia atrapalhado a minha respiração, mas que respiração? Notei que eu não estava respirando.
            Tirei a camisa e vi o grande T costurado com grandes pontos que ia do meu peito até a barriga, era a marca da autópsia.
           

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CAPÍTULO 3

Para meu completo horror, notei que não sentia nada. Não havia dor. Ao checar o peito, reparei que meu coração não batia. Eu estava mesmo morto? Afinal eu havia me tornado a porra de um morto-vivo?
            De repente soltei um arroto monstruoso e comecei a vomitar todo o frango assado pelo banheiro. Manchando os azulejos branquinhos. 
E então a fome voltou pior, como uma dor lancinante, desesperadora.
            Mas se eu era mesmo um morto-vivo eu precisava comer carne humana certo? Não era isso que os errantes comiam nos filmes? Se dizem que come então deve haver algum fundamento.
            Pode parecer bizarro acordar em seu próprio funeral e descobrir que você não está morto, mas também não está vivo, e que de alguma forma consegue falar, andar e sente uma fome do cão. Na verdade, a fome meio que estava me dominando, mesmo que eu tentasse pensar em outras coisas, tudo que importava era me alimentar e matar aquela fome angustiante e feroz que parecia estar me corroendo por dentro.
            A campainha tocou. Eu corri para a porta do meu barraco e escancarei-a. E lá estava o meu velho conhecido, o Doutor Rubens, o médico da cidade.
            Assustado, me olhando incrédulo ele adentrou o aposento. Fechei a porta atrás dele.
             -Você foi diagnosticado morto há 3 dias meu caro Clóvis. - começou o Doutor, coçando o queixo de barba rala enquanto me encarava fascinado. Era um homem já na casa dos 60. Baixinho, gorducho e de pele rosada, como um leitão.  -O lote da vacina veio com problemas e isso foi o motivo de sua morte, causando uma alta dosagem de adrenalina no seu sangue e posteriormente uma parada cardíaca. Mas aqui está você; vivo! Isso é um milagre, mas precisamos ir para o centro médico agora, fazer uns exames e...
            Eu não deixei ele terminar, sua cara redonda, me fitando excitado pelo fascínio do milagre de minha volta, me deixou com fome, muita fome, então o ataquei, agarrando seus ombros e dando a maior mordida faminta em seu pescoço, devorando um grande e suculento pedaço de carne.                         
            Eu havia mordido a jugular do doutor, fazendo seu sangue vermelho brilhante jorrar, como um bebedouro para vampiros.

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CAPÍTULO 4

            Um banquete, eu me esbaldei daquele velho obeso, gordo como um suíno. A carne humana parecia doce, suculenta, uma iguaria que derretia entre meus dentes, o caldinho morno do sangue descendo pela minha garganta ia acalmando minha ferocidade, saciando minha fome.
            Ainda era eu, mas um novo eu, o senso de moral havia desaparecido, deixando-me ser dominado pelo puro instinto de sobrevivência.
            Eu me esbaldei, sem remorso, sem pena, sem me importar, assim como todo mundo faz ao comer a carne de um animal no almoço, sem dar a mínima para quem era aquele animal. Apenas devorando a refeição mais importante do dia.
            Mas, passados uns minutos, eu comecei a vomitar em grandes jatos toda aquela carne. Nada parava em meu estômago. E a fome recomeçava, cada vez pior.
            -Mas que porra de zumbi eu sou caralho? - berrei, furioso, dando um chute na cabeça gorda do doutor que estava sobre o carpete da sala. -Aaaaarrrgggg!!!
Eu estava enlouquecendo, a fome era terrível, era como se fosse uma dor por todo o corpo, uma dor terrível, o estômago roncava, se contraía, eu precisava comer, mas o quê? Não era carne humana dos vivos que zumbis comiam nas porras dos filmes?
            Desesperado eu corri para meu quarto e peguei meu 38 carregado, coloquei o cano na cabeça e me preparei, afinal, se zumbis na vida real não comiam carne humana como nos filmes, quem sabe morreria com um tiro no cérebro.
            Puxei o gatilho e... BANG!!

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CAPÍTULO 5


            -Puta que pariu. Caralho, caralho... que dor...- A bala em meu cérebro provocou uma sensação pior que um exame de próstata. Incomodou pra cacete e mais uma vez não funcionou. Tudo que já havia lido e visto sobre zumbis estavam errados.
Mordi as costas da minha mão na esperança de passar a dor no cérebro. Era algo que eu sempre fazia em vida, tentava provocar uma dor para esquecer a outra.
            Mas quando dei por mim estava mastigando um pedaço da minha mão e o sabor era muito agradável, delicioso. A dor na cabeça parou e comecei a ter uma sensação de prazer, estava me saciando, mordi outro pedaço, mais um...
            Quando finalmente me senti saciado, já havia comido todo o meu braço, sobrou apenas o toco do ombro. Joguei o osso do braço no chão e arrotei.
            Estava realmente satisfeito, alimentado e dessa vez não passei mal.
            Eu estava me sentindo muito bem, poderia morrer feliz fazendo o que eu mais gostava enquanto vivo ou depois de morto: comer, e o prato principal era eu. 

https://noitesdehalloween.wixsite.com/allanfear/o-sabor-do-medo

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