Escrito
por ALLAN FEAR
CAPÍTULO
1
O elegante Sr. Matheus
fez sua caminhada diária até se sentar no único banco vago de madeira da praça.
Desdobrou o jornal que carregava embaixo do braço e murmurou alguma coisa em
cumprimento ao velhote ao seu lado.
O Sr. Matheus gostava de aproveitar os minutos que lhe
restavam do horário de almoço, após a refeição, para se sentar num banco da
praça e ler as notícias. Era seu ritual habitual de segunda a sexta.
O dia era cinzento e o vento frio do início de inverno
soprava as folhas mortas, obrigando-o a segurar o jornal com um pouco mais de
força.
A praça estava movimentada, algumas pessoas transitavam,
outras estavam sentadas nos velhos bancos e mais algumas se amontoavam em um
ponto de ônibus. A avenida estava com alto fluxo de veículos, como sempre.
Ao redor do homem gordo e calvo sentado ao lado do Sr.
Matheus, reuniam-se vários pombos, pois este os alimentava com milho.
O Sr. Matheus tentava se concentrar nas notícias do
jornal que falavam sobre a crise financeira, mas ele sentia repulsa por aquelas
aves. Lembrava-se bem do quanto aquelas criaturas infernizavam sua vida, sempre
cagando em sua cabeça ou invadindo seu apartamento.
Ah! Como o Sr. Matheus desejava se levantar e sair
pisando em um por um daqueles pombos e ter o prazer em seguida de limpar suas
vísceras e penas da sola de seus sapatos.
-Com licença senhor, - o Sr. Matheus foi interrompido de
seus pensamentos sórdidos pelo velho gordo que segurava um saquinho de milho.
-Poderia me fazer a gentileza de terminar de alimentar esses graciosos pombos
por mim? É que me deu vontade de dar uma cagada, sabe? Na minha idade isso não
pode esperar.
-Mas eu... – murmurou o Sr. Matheus, porém o velho gordo
lhe entregou o saquinho de milho e saiu às pressas.
Os pombos se apressaram a cercar o Sr. Matheus, ansiosos
por mais alimento, uma vez que já haviam limpado todos os carocinhos de milho
do chão.
-Eu os alimentaria com muito gosto se ao invés de milho
eu tivesse chumbinho. – murmurou o Sr. Matheus amargamente, olhando com ódio
para aqueles fofos pombinhos que eram em torno de 7 ou 9.
Com um sorriso no rosto jovial bem barbeado, o homem
estava na casa dos 45, embora aparentava ter menos devido ao seu cabelo muito
preto e sua pele muito bem cuidada. Levantou-se e jogou o saquinho de milho
dentro de uma lixeira anexada a um poste. Em seguida voltou tranquilamente e se
sentou no banco para voltar à sua leitura, ignorando os pombos ainda
famintos.
CAPÍTULO
2
Um sorriso de escárnio brilhou nos lábios finos do Sr.
Matheus quando viu os pombos começarem a ir embora.
Não passou muito tempo, apenas algumas passadas das
páginas de jornal, quando o Sr. Matheus sentiu uma das aves pousar em seu ombro
esquerdo.
O homem se assustou, mas viu que a ave parecia calma. Ele
queria socar o bicho para que saísse de cima dele, mas era um homem elegante,
de classe, não poderia deixar saberem que ele era violento.
O
Sr. Matheus dobrou cuidadosamente o jornal sobre o colo e ergueu a mão direita
para o pombo, que se empoleirou em seu dedo indicador tal como fazem as aves
adestradas.
-Uau! Olha que coisa mais fofa! – falou uma jovem de
cabelo roxo com mochila nas costas sobre um Skate. -Que pombo mais dócil! Deixa
eu tirar uma foto moço?
-Ãh? Bem eu... er... – enquanto o Sr Matheus se
atrapalhava com as palavras, a jovem desceu do Skate e retirou um grande
Smartphone do bolso e começou a tirar fotos daquela cena inusitada.
-Parece que ele quer te dar um beijo moço. Que lindo,
aproxima seu rosto para eu registrar esse momento! - falou a jovem, encantada com o pombo branco inclinando a
cabeça em direção ao rosto do homem.
O Sr. Matheus, meio sem jeito, aproximou o rosto perto da
ave e sentiu aquele fedor de pombos que ele tanto odiava. Seu almoço revirou no
estômago, mas ele tentou manter as aparências, pensando se teria uma chance de
quebrar o pescoço do bicho sem que ninguém visse e o jogasse na lata de lixo
quando aquela sessão de fotos terminasse.
CAPÍTULO
3
Muitos curiosos estavam parando para ver aquela cena, o
pombo aproximou o bico e pareceu beijar o nariz do Sr. Matheus. Todos estavam
encantados com o quanto aquela ave parecia amá-lo.
Mas então, rápido como o bote de uma cascavel, o pombo
atacou, enfiando seu bico no olho esquerdo do Sr. Matheus e puxando ferozmente
seu globo ocular numa bicada certeira.
-Aaaaahhhhh!!! – o berro de dor explodiu da boca do homem
quando a ave alçou voo, levando no bico aquele globo ocular. Um lamento de
horror ecoou na praça, todos estavam chocados.
O Sr. Matheus colocou a palma da mão aberta sobre sua
órbita vazia, sentindo seu sangue quente fluir entre os dedos.
O
Sr. Matheus gritava e berrava, ficou de pé, gemendo, orando para que aquela dor
lancinante parasse. As pessoas à sua volta estavam apavoradas, umas tentavam
chamar uma ambulância, outras não suportavam olhar para ele. O pânico era
geral.
Mas
para seu completo horror, o Sr. Matheus viu uma revoada de pombos se
aproximando dele, famintos, loucos para devorar o olho que ainda lhe restava.
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