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MIOLOS PARA O JANTAR


https://www.youtube.com/watch?v=Ez0AWd-Ka9Q

Escrito por ALLAN FEAR

Este conto é continuação de
 "Apodrecido até a alma"

https://osabordomedo.blogspot.com/2020/02/apodrecido-ate-alma.html
  
CAPÍTULO 1

Enquanto eu degustava um saboroso saquinho de Doritos, apoiada com meus braços no guidão do carrinho de supermercado, minha Tia Izaura lutava para alcançar algumas latas de conserva no alto da gôndola.
            Estávamos no Hawthermart fazendo compras. Graças aos meus pais eu teria de passar algumas semanas com minha tia enquanto eles faziam uma viagem de negócios para outro país.
            Hawthersville era o nome da estranha cidadezinha onde minha tia vivia. Era um lugar sombrio e cheio de casas velhas.
            Meu nome é Joylie Hogguer, tenho 12 anos e aquele início de férias estava sendo o pior da minha vida. Seria frustrante demais ficar na casa da minha tia, ela era bem velhota, do tipo que só usa saía até os joelhos e um meião cobrindo toda a canela e está sempre com rolinho nos cabelos. Além disso ela é um pouco gorducha e não conversa muito.
            -Ahhhhh!! - O grito explodiu, de repente, da boca da minha tia e me fez cuspir os Doritos que já estavam prontos para serem engolidos.
            O espanto tomou conta de mim quando vi que um braço ossudo havia saído de debaixo da ondula de conservas e agarrava a perna de minha tia.
            
https://noitesdehalloween.wixsite.com/allanfear/o-sabor-do-medo


CAPÍTULO 2

Desesperada, minha tia se desvencilhou da mão que agarrava sua perna e começou a correr pelo corredor de prateleiras gritando que havia um tarado embaixo da gôndola.
            -Socorro, tem um tarado embaixo da gôndola, ele tentou tirara minha saia e apertou meus mamilos.
            Minha tia era tão exageradamente dramática que tive de revirar os olhos.
            Curiosa, pensando em se tratar de uma pegadinha, larguei o saquinho de Doritos dentro do carrinho de compras e me abaixei perto do braço que se contorcia no chão como uma cobra e dei uma espiadinha lá debaixo.
            Má ideia. Meus olhos se encheram de horror com o que eu vi lá debaixo e então foi minha vez de começar a gritar.

https://noitesdehalloween.wixsite.com/allanfear/sacrificios


CAPÍTULO 3

Eu não podia acreditar no que meus olhos fitaram lá debaixo. Era um homem velho, muito velho mesmo, de pele terrivelmente pálida e a cabeça arruinada.
            Parecia que haviam esmagado a cabeça do velho, mas ele ainda estava vivo, seus olhos brancos me fitaram enquanto ele batia os dentes gemendo em uma voz fraca e sem forças.  De sua boca um odor de carniça começou a poluir o ar e eu senti os Doritos revirarem em meu estômago.
            Logo várias pessoas chegaram e ajudaram o velho a sair de debaixo da gôndola. Mas foi uma tarefa difícil, pois ele parecia preso lá e muito machucado.
O corredor logo estava abarrotado de gente. As pessoas se acotovelavam para ver enquanto homens vestidos de branco ajudavam o velho, colocando-o em uma maca.
O Mais assustador foi que os homens evitavam a boca do idoso cujos dentes ficavam se debatendo e rangendo.
Parecia louco e surreal, mas eu soube que aquele velho estava morto. Ele não passava de um zumbi.
Eu tirei meu celular do bolso do meu short Jeans, mas os homens já estavam conduzindo o velho para fora do supermercado, abrindo lugar entre os curiosos.
Eu precisava filmar isso, mas foi aí que tudo ficou ainda mais assustador.


https://noitesdehalloween.wixsite.com/allanfear/hawther-em-quadrinhos


CAPÍTULO 4

Enquanto seguia os homens que levavam o velho zumbi, eu comecei a gravar tudo. Vi eles saírem do supermercado para o fim de tarde cinzenta e fria lá fora e o colocarem em uma ambulância.
Sorrateiramente eu me esgueirei pelo meio dos curiosos e esperei.
Os dois homens de branco colocaram o velho na parte de trás da ambulância e saíram, reparei que eles estavam arfando, lutando para respirar e reclamando do fedor que exalava do ancião.
Foi neste momento que, agindo puramente por impulso, eu decidi aproveitar a distração deles e entrei na surdina dentro da ambulância.
O velho se debateu quando percebeu minha presença e começou a gemer baixinho. Eu me escondi em um canto e tapei o nariz, o fedor de carniça era terrível.
Logo eles fecharam as portas traseiras do veículo e aceleraram para longe do supermercado.
Com minha mão trêmula pela emoção eu lutei para segurar o telefone no alto e filmar a cara do velho.
Um sorriso brilhou em meus lábios. Por anos eu tentava fazer algum vídeo legal para meu canal de cinco inscritos no You Tube, mas nenhum jamais havia viralizado.
Mas agora eu teria meu vídeo incrível, provando a existência de zumbis.




CAPÍTULO 5

Foi tudo tão surreal, eu ali dentro da ambulância que corria loucamente pelas ruas estreitas, lutando para manter o telefone filmando o velho zumbi amarrado à maca.
Então o veículo parou e me escondi o máximo que pude atrás de uma lona. Como eu era magra e baixinha, isso não foi difícil.
Os homens abriram as portas traseiras do carro e retiraram a maca com o velho. Por uma fresta eu reparei que agora eles usavam máscaras de dentista para não respirarem toda aquela carniça.
Eu os segui, estávamos na garagem de uma mansão rústica de estilo medieval. Eu reconheci a aquela mansão, havíamos passado em frente a ela quando meus pais me levavam para a casa da minha tia.
Sorrateira como um felino, com o celular filmando tudo eu os segui. Eles conduziram o velho para a parte de trás da mansão, descendo uma rampa. Havia ali um porão amplo.
Os dois homens tiveram um pouco de dificuldade para descer as escadas íngremes de piso de pedra que conduzia ao porão.
Eu segui logo atrás, na surdina e quando cheguei ao patamar tratei de me esconder atrás de alguns barris de vinho.
Eu me espantei quando percebi que aquele porão era uma espécie de laboratório antigo, com cadeira de dentista, diversos tubos de ensaio com produtos coloridos e alguns monitores e equipamentos médicos.
Uma mulher surgiu e ordenou que colocassem o velho na mesa de dentista e o amarrassem nela.
Meu coração batia a mil dentro do peito enquanto eu assistia aquela cena horripilante da mulher de máscara de dentista e avental verde-claro se preparando para operar o velho.
Eu não sabia se teria estômago para aquilo, mas precisava filmar tudo para poder evidenciar os fatos.
Mas naquele silêncio sombrio do porão úmido e estranho, o som de uma mensagem no meu celular fez meu sangue gelar e todos se voltaram para mim.


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CAPÍTULO 6


Eu comecei a correr subindo alucinadamente as escadas enquanto mandava o vídeo que acabara de gravar para meu canal, pois sabia que se eles me pegassem iriam apagar as filmagens.
Pobre de mim, não consegui nem sair do porão quando braços fortes me pegaram pelos ombros enquanto me debatia.
Um dos homens me arrastou para baixo e antes que eu pudesse conseguir me desvencilhar dele, senti uma picadinha no braço e quando me voltei, vi apenas a mulher puxar a seringa e tudo ficou negro como carvão.


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CAPÍTULO 7

Eu não sei quanto tempo eu fiquei desacordada. Quem sabe horas ou talvez dias? Realmente eu não sei.
Abri meus olhos quando voltei a mim e senti minhas pálpebras pesadas. A luz brilhante do teto fez minhas pupilas doerem e tive que fechar os olhos e piscar várias vezes até entender o que estava acontecendo à minha volta.
Primeiro eu senti o cheiro de carniça, depois, quando tentei tapar as narinas, percebi que não conseguia mover os braços e então senti que estava amarrada por grossas cordas.
Então, por fim, dei-me conta da minha situação e da grande encrenca em que eu havia me metido.
Eu estava amarrada à uma cadeira de madeira muito antiga e ao meu lado eu vi uma mesinha. Sobre essa mesinha havia alguns instrumentos cirúrgicos e uma furadeira com algumas brocas e tudo estava cheio de sangue e pedaços de cabelo loiro.
Eu senti ânsia de vômito quando vi na beira da mesa o tampo de uma cabeça humana e gritei quando uma porta se abriu com um lamento e vi aquele velho zumbi adentrar o aposento com seu andar cambaleante, vindo em minha direção.
Eu comecei a gritar e me debater, sentia-me extremamente zonza e grogue e notei algo escorrer por minha testa a medida que o zumbi vinha para me pegar.
Pensei que fosse suor minando de minha testa, mas quando este tocou meus olhos, senti que era um liquido viscoso e de cheiro estranho.
O velho se curvou e colocou as mãos ossudas sobre meu rosto, eram frias e nojentas. Reparei que haviam costurado a cabeça dele, deixando uma sutura horripilante.
-O que você vai fazer comigo? - Comecei a gritar desesperada. -Socorro!! Tirem me daqui!!
O velho passou a língua seca sobre os lábios roxos e se aproximou de minha cabeça. Suas mãos ossudas e frias apertavam minhas orelhas.
Então eu senti a dentada, não na minha cabeça, mas diretamente no meu cérebro.
-Aaaaahhhhhhhh!!! - O grito de dor explodiu de minha boca enquanto o zumbi devorava meu cérebro com mordidas famintas. 


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CAPÍTULO 8

Negro como a mais densas trevas. Após a dor eu não vi mais nada, a escuridão silenciosa me engoliu.
            Mas então, de um segundo para outro, eu voltei, ouvi o ruído viscoso de mastigação e vi o zumbi ainda debruçado sobre mim, comendo meu cérebro.
Mas não havia mais dor, fazia apenas cócegas nos meus miolos.  
Eu havia feito uma descoberta incrível, evidenciado a existência de zumbis, mas jamais pensei que poderia me tornar sua refeição.
Será que há a possibilidade deste maldito velho não comer todo o meu cérebro e eu voltar como zumbi também?
-Argh! - Ouvi o zumbi produzir um som nojento e doentio. Em seguida ele cambaleou para trás e um sorriso maligno brilhou em meus lábios quando vi que ele estava engasgando com meu cérebro.
O zumbi cambaleou como uma barata tonta pelo aposento enquanto produzia estranhos sons de sufocamento e sucção.
Por fim o velho fétido se estatelou pesadamente sobre o chão e não mais se mexeu. Mas sua pele começou a ficar roxa e surgiram inúmeros furúnculos para em seguida eclodirem até todo o corpo do idoso não passar de uma massa disforme de carne e pus.
A mulher e os dois homens vieram desesperados e pararam chocados enquanto fitavam o velho se desfazer naquele emaranhado de vísceras.
Enquanto eu me debatia para tentar escapar, notei que pedaços de meu cérebro começaram a cair de minha cabeça aberta.
Mas a parte mais assustadora foi, quando puramente por instinto, eu coloquei a língua para fora da boca e consegui fisgar um naco de cérebro, o mastiguei e engoli, o sabor era delicioso.
Não sei como, mas tomada de uma força inumana e rosnando como um animal, eu arrebentei as cordas que me prendiam e avancei sobre um dos homens, abocanhando vorazmente seu pescoço.
Alguns instantes depois eu estava ali, naquele aposento sujo e fétido, como um animal saboreando suas presas abatidas.
Aconteceu tudo tão rápido, eu não havia pensado ou planejado, apenas os ataquei com mordidas fatais, derrubando-os no chão e comecei a degustá-los, devorando aquelas carnes macias e suculentas.
Por fim, após a comilança, quando os defuntos já começavam a voltar dos mortos como zumbis gemedores, eu ouvi um barulho e corri para fora daquele aposento.
Foi então que vi que aquele som que me parecia familiar, vinha do meu telefone que estava sobre uma mesa, aproximei-me dele e vi a foto de minha tia, ela estava me ligando.
Tudo parecia meio confuso na minha mente, ainda era eu, mas com aquele instinto voraz me controlando, fazendo aquele gemido horripilante escapar por meus lábios.
Eu queria atender o telefone e ouvir a voz de minha tia, mas tudo que eu podia pensar era qual seria o sabor de sua carne. 

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