Escrito
por ALLAN FEAR
Este conto é continuação de
"Apodrecido até a alma"
"Apodrecido até a alma"
CAPÍTULO
1
Enquanto eu degustava um saboroso
saquinho de Doritos, apoiada com meus braços no guidão do carrinho de
supermercado, minha Tia Izaura lutava para alcançar algumas latas de conserva
no alto da gôndola.
Estávamos
no Hawthermart fazendo compras. Graças aos meus pais eu teria de passar algumas
semanas com minha tia enquanto eles faziam uma viagem de negócios para outro
país.
Hawthersville
era o nome da estranha cidadezinha onde minha tia vivia. Era um lugar sombrio e
cheio de casas velhas.
Meu
nome é Joylie Hogguer, tenho 12 anos e aquele início de férias estava sendo o
pior da minha vida. Seria frustrante demais ficar na casa da minha tia, ela era
bem velhota, do tipo que só usa saía até os joelhos e um meião cobrindo toda a
canela e está sempre com rolinho nos cabelos. Além disso ela é um pouco
gorducha e não conversa muito.
-Ahhhhh!!
- O grito explodiu, de repente, da boca da minha tia e me fez cuspir os Doritos
que já estavam prontos para serem engolidos.
O
espanto tomou conta de mim quando vi que um braço ossudo havia saído de debaixo
da ondula de conservas e agarrava a perna de minha tia.
CAPÍTULO
2
Desesperada, minha tia se desvencilhou
da mão que agarrava sua perna e começou a correr pelo corredor de prateleiras
gritando que havia um tarado embaixo da gôndola.
-Socorro,
tem um tarado embaixo da gôndola, ele tentou tirara minha saia e apertou meus
mamilos.
Minha
tia era tão exageradamente dramática que tive de revirar os olhos.
Curiosa,
pensando em se tratar de uma pegadinha, larguei o saquinho de Doritos dentro do
carrinho de compras e me abaixei perto do braço que se contorcia no chão como
uma cobra e dei uma espiadinha lá debaixo.
Má
ideia. Meus olhos se encheram de horror com o que eu vi lá debaixo e então foi
minha vez de começar a gritar.
CAPÍTULO
3
Eu não podia acreditar no que meus
olhos fitaram lá debaixo. Era um homem velho, muito velho mesmo, de pele terrivelmente
pálida e a cabeça arruinada.
Parecia
que haviam esmagado a cabeça do velho, mas ele ainda estava vivo, seus olhos
brancos me fitaram enquanto ele batia os dentes gemendo em uma voz fraca e sem
forças. De sua boca um odor de carniça
começou a poluir o ar e eu senti os Doritos revirarem em meu estômago.
Logo
várias pessoas chegaram e ajudaram o velho a sair de debaixo da gôndola. Mas
foi uma tarefa difícil, pois ele parecia preso lá e muito machucado.
O corredor logo
estava abarrotado de gente. As pessoas se acotovelavam para ver enquanto homens
vestidos de branco ajudavam o velho, colocando-o em uma maca.
O Mais assustador foi
que os homens evitavam a boca do idoso cujos dentes ficavam se debatendo e rangendo.
Parecia louco e
surreal, mas eu soube que aquele velho estava morto. Ele não passava de um
zumbi.
Eu tirei meu celular
do bolso do meu short Jeans, mas os homens já estavam conduzindo o velho para
fora do supermercado, abrindo lugar entre os curiosos.
Eu precisava filmar
isso, mas foi aí que tudo ficou ainda mais assustador.
CAPÍTULO 4
Enquanto seguia os
homens que levavam o velho zumbi, eu comecei a gravar tudo. Vi eles saírem do
supermercado para o fim de tarde cinzenta e fria lá fora e o colocarem em uma ambulância.
Sorrateiramente eu me
esgueirei pelo meio dos curiosos e esperei.
Os dois homens de
branco colocaram o velho na parte de trás da ambulância e saíram, reparei que
eles estavam arfando, lutando para respirar e reclamando do fedor que exalava
do ancião.
Foi neste momento
que, agindo puramente por impulso, eu decidi aproveitar a distração deles e
entrei na surdina dentro da ambulância.
O velho se debateu
quando percebeu minha presença e começou a gemer baixinho. Eu me escondi em um
canto e tapei o nariz, o fedor de carniça era terrível.
Logo eles fecharam as
portas traseiras do veículo e aceleraram para longe do supermercado.
Com minha mão trêmula
pela emoção eu lutei para segurar o telefone no alto e filmar a cara do velho.
Um sorriso brilhou em
meus lábios. Por anos eu tentava fazer algum vídeo legal para meu canal de
cinco inscritos no You Tube, mas nenhum jamais havia viralizado.
Mas agora eu teria
meu vídeo incrível, provando a existência de zumbis.
CAPÍTULO
5
Foi tudo tão surreal,
eu ali dentro da ambulância que corria loucamente pelas ruas estreitas, lutando
para manter o telefone filmando o velho zumbi amarrado à maca.
Então o veículo parou
e me escondi o máximo que pude atrás de uma lona. Como eu era magra e baixinha,
isso não foi difícil.
Os homens abriram as
portas traseiras do carro e retiraram a maca com o velho. Por uma fresta eu
reparei que agora eles usavam máscaras de dentista para não respirarem toda
aquela carniça.
Eu os segui, estávamos
na garagem de uma mansão rústica de estilo medieval. Eu reconheci a aquela
mansão, havíamos passado em frente a ela quando meus pais me levavam para a
casa da minha tia.
Sorrateira como um
felino, com o celular filmando tudo eu os segui. Eles conduziram o velho para a
parte de trás da mansão, descendo uma rampa. Havia ali um porão amplo.
Os dois homens
tiveram um pouco de dificuldade para descer as escadas íngremes de piso de
pedra que conduzia ao porão.
Eu segui logo atrás,
na surdina e quando cheguei ao patamar tratei de me esconder atrás de alguns
barris de vinho.
Eu me espantei quando
percebi que aquele porão era uma espécie de laboratório antigo, com cadeira de
dentista, diversos tubos de ensaio com produtos coloridos e alguns monitores e
equipamentos médicos.
Uma mulher surgiu e
ordenou que colocassem o velho na mesa de dentista e o amarrassem nela.
Meu coração batia a
mil dentro do peito enquanto eu assistia aquela cena horripilante da mulher de
máscara de dentista e avental verde-claro se preparando para operar o velho.
Eu não sabia se teria
estômago para aquilo, mas precisava filmar tudo para poder evidenciar os fatos.
Mas naquele silêncio
sombrio do porão úmido e estranho, o som de uma mensagem no meu celular fez meu
sangue gelar e todos se voltaram para mim.

CAPÍTULO
6
Eu comecei a correr subindo
alucinadamente as escadas enquanto mandava o vídeo que acabara de gravar para
meu canal, pois sabia que se eles me pegassem iriam apagar as filmagens.
Pobre de mim, não consegui
nem sair do porão quando braços fortes me pegaram pelos ombros enquanto me
debatia.
Um dos homens me
arrastou para baixo e antes que eu pudesse conseguir me desvencilhar dele,
senti uma picadinha no braço e quando me voltei, vi apenas a mulher puxar a seringa
e tudo ficou negro como carvão.
CAPÍTULO
7
Eu não sei quanto tempo eu fiquei
desacordada. Quem sabe horas ou talvez dias? Realmente eu não sei.
Abri meus olhos
quando voltei a mim e senti minhas pálpebras pesadas. A luz brilhante do teto
fez minhas pupilas doerem e tive que fechar os olhos e piscar várias vezes até
entender o que estava acontecendo à minha volta.
Primeiro eu senti o
cheiro de carniça, depois, quando tentei tapar as narinas, percebi que não
conseguia mover os braços e então senti que estava amarrada por grossas cordas.
Então, por fim,
dei-me conta da minha situação e da grande encrenca em que eu havia me metido.
Eu estava amarrada à
uma cadeira de madeira muito antiga e ao meu lado eu vi uma mesinha. Sobre essa
mesinha havia alguns instrumentos cirúrgicos e uma furadeira com algumas brocas
e tudo estava cheio de sangue e pedaços de cabelo loiro.
Eu senti ânsia de
vômito quando vi na beira da mesa o tampo de uma cabeça humana e gritei quando
uma porta se abriu com um lamento e vi aquele velho zumbi adentrar o aposento
com seu andar cambaleante, vindo em minha direção.
Eu comecei a gritar e
me debater, sentia-me extremamente zonza e grogue e notei algo escorrer por
minha testa a medida que o zumbi vinha para me pegar.
Pensei que fosse suor
minando de minha testa, mas quando este tocou meus olhos, senti que era um liquido
viscoso e de cheiro estranho.
O velho se curvou e
colocou as mãos ossudas sobre meu rosto, eram frias e nojentas. Reparei que
haviam costurado a cabeça dele, deixando uma sutura horripilante.
-O que você vai fazer
comigo? - Comecei a gritar desesperada. -Socorro!! Tirem me daqui!!
O velho passou a língua
seca sobre os lábios roxos e se aproximou de minha cabeça. Suas mãos ossudas e
frias apertavam minhas orelhas.
Então eu senti a
dentada, não na minha cabeça, mas diretamente no meu cérebro.
-Aaaaahhhhhhhh!!! - O
grito de dor explodiu de minha boca enquanto o zumbi devorava meu cérebro com
mordidas famintas.
CAPÍTULO
8
Negro como a mais densas trevas. Após a
dor eu não vi mais nada, a escuridão silenciosa me engoliu.
Mas
então, de um segundo para outro, eu voltei, ouvi o ruído viscoso de mastigação
e vi o zumbi ainda debruçado sobre mim, comendo meu cérebro.
Mas não havia mais
dor, fazia apenas cócegas nos meus miolos.
Eu havia feito uma
descoberta incrível, evidenciado a existência de zumbis, mas jamais pensei que
poderia me tornar sua refeição.
Será que há a
possibilidade deste maldito velho não comer todo o meu cérebro e eu voltar como
zumbi também?
-Argh! - Ouvi o zumbi
produzir um som nojento e doentio. Em seguida ele cambaleou para trás e um
sorriso maligno brilhou em meus lábios quando vi que ele estava engasgando com
meu cérebro.
O zumbi cambaleou
como uma barata tonta pelo aposento enquanto produzia estranhos sons de
sufocamento e sucção.
Por fim o velho
fétido se estatelou pesadamente sobre o chão e não mais se mexeu. Mas sua pele
começou a ficar roxa e surgiram inúmeros furúnculos para em seguida eclodirem
até todo o corpo do idoso não passar de uma massa disforme de carne e pus.
A mulher e os dois
homens vieram desesperados e pararam chocados enquanto fitavam o velho se
desfazer naquele emaranhado de vísceras.
Enquanto eu me
debatia para tentar escapar, notei que pedaços de meu cérebro começaram a cair
de minha cabeça aberta.
Mas a parte mais
assustadora foi, quando puramente por instinto, eu coloquei a língua para fora
da boca e consegui fisgar um naco de cérebro, o mastiguei e engoli, o sabor era
delicioso.
Não sei como, mas
tomada de uma força inumana e rosnando como um animal, eu arrebentei as cordas
que me prendiam e avancei sobre um dos homens, abocanhando vorazmente seu
pescoço.
Alguns instantes
depois eu estava ali, naquele aposento sujo e fétido, como um animal saboreando
suas presas abatidas.
Aconteceu tudo tão
rápido, eu não havia pensado ou planejado, apenas os ataquei com mordidas fatais,
derrubando-os no chão e comecei a degustá-los, devorando aquelas carnes macias
e suculentas.
Por fim, após a
comilança, quando os defuntos já começavam a voltar dos mortos como zumbis
gemedores, eu ouvi um barulho e corri para fora daquele aposento.
Foi então que vi que
aquele som que me parecia familiar, vinha do meu telefone que estava sobre uma
mesa, aproximei-me dele e vi a foto de minha tia, ela estava me ligando.
Tudo parecia meio
confuso na minha mente, ainda era eu, mas com aquele instinto voraz me
controlando, fazendo aquele gemido horripilante escapar por meus lábios.
Eu queria atender o
telefone e ouvir a voz de minha tia, mas tudo que eu podia pensar era qual
seria o sabor de sua carne.
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