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CÉRBERO – CRIATURA ASSASSINA

 


Escrito por ALLAN FEAR

 

Capítulo 1

 

O sol da tarde brilhava radiante num céu sem nuvens. A família Cortez voltava para casa em um carro sport preto.

-Tivemos um agradável dia neste novo clube.- comentou a Sra. Emília, que ia sentada no banco da frente, ao lado de seu marido, que estava ao volante.

-Foi muita gentileza da sua amiga, nos ceder os 4 convites.- disse o Sr. Otávio, com as mãos ao volante e lançando um olhar para Emília.

-Por que não compram uma cota do clube?- perguntou Jessie, a filha mais velha da família Cortez, que ia sentada no banco de trás, ao lado do irmão mais novo, Flávio, de 14 anos. Ambos magros, de cabelo preto e liso, e pele clara, que agora estava com um certo bronzeado. Já os pais, a Sra. Emília era uma loura de belos olhos verdes acinzentados. O Sr. Otávio, de belos olhos azuis-claros era gordo, cabelos castanhos e encaracolados, pele clara e após tomar sol, ficava com a epiderme rosada.  

-É mesmo, Otávio. Por que não compramos uma cota?- perguntou Emília sorridente, pousando a mão no ombro do marido, e sorrindo-lhe.

-Talvez.- murmurou Sr. Otávio, com os olhos na estrada.

-Ah! Pai...- gritou Flávio, apoiando as mãos na poltrona do pai e erguendo sua cabeça para fitá-lo. –Hoje ainda é sábado, compre a cota e poderemos aproveitar o clube também amanhã. O que acha?

-Hmm... vou pensar. Mas quero chegar logo em casa e tomar um belo banho frio, depois digo a resposta.- disse o Sr. Otávio, enquanto virava o volante para fazer uma curva bem fechada.

Após a curva ouviu-se um forte barulho de buzina, quando um caminhão passou em sentindo contrário a eles, na outra pista.

-Quem era?- perguntou a Sra. Emília, enquanto olhava para trás, vendo, pelo vidro traseiro, o grande caminhão se afastar.

-Acho que era o Sr. Wagner.- disse o Sr. Otávio, olhando pelo retrovisor o caminhão se afastar. –Um caminhoneiro que fiquei conhecendo há poucos dias.

-Pai! Pare o carro!- gritou Jessie, num tom aterrorizado.

-Oh! Meu Deus!- berrou o Sr. Otávio, quase sem fôlego, pisando com força no pedal do freio. Fazendo o carro derrapar ruidosamente no asfalto, atropelando um grande cachorro de pêlo amarronzado.

 

Capítulo 2

 

O cão foi atirado a alguns metros do carro. Ficou caído, imóvel no asfalto.

-Otávio, você atropelou um cachorro!- lamentou-se a Sra. Emília, pondo as mãos sobre a boca.

-O pobre animal entrou de repente na minha frente. Não deu nem mesmo tempo para desviar.- disse o Sr. Otávio, depois desceu do carro e andou até o cachorro, que permanecia caído, imóvel.

Estaria morto?

Todos saíram do veículo, mas a Sra. Emília, não deixou que os jovens se aproximassem do animal ferido. Segurou-os atrás do carro.

-Será que está morto?- perguntou o Sr. Otávio em voz baixa, levando sua mão para tocar a cabeça do grande e peludo cachorro, que tinha uma ampla barriga.

Mas antes que ele pudesse tocá-lo, o cão abriu os olhos negros e fitou-o medonhamente. O Sr. Otávio deu um pulo pra trás. Vendo assustado o grande cão, que começara a rugir bravamente.

-O que há com ele?- perguntou a Sra. Emília num grito.

-É uma cadela.- disse o Sr. Otávio, após o cão tentar se levantar e cair de lado. –E está esperando filhotes.

-Podemos levá-la pra casa e ficar com um dos filhotes quando nascer?- perguntou Jessie, aproximando-se do pai e fitando o animal deitado, que parara de rosnar. Talvez percebera que aquelas pessoas queriam ajudá-la.

-Isso mesmo.- disse Flávio, também se aproximando da cadela, junto com a mãe. –Podemos ficar com um dos seus filhotes?

Finalmente Jessie e Flávio concordavam em alguma coisa. Ambos queriam ter um cachorro.

-Otávio, as crianças têm razão.- disse a Sra. Emília. –Não podemos deixar a pobrezinha aqui. Logo ela vai ter filhotes. E ainda mais agora que está machucada. Precisa de ajuda. Vamos levá-la pra nossa casa.

O Sr. Otávio ficou em silêncio por alguns segundos, deu uma coçada na parte de trás da cabeça, onde ainda lhe restava algum cabelo, depois, olhando para a cadela, que lhe retribuía o olhar, disse:

-Está bem. Mas devemos deixá-la longe de Michele, aquela gata não gosta muito de cães. Então vamos levá-la para nossa casa, e perguntar por aí, acho que ela deve ter dono. Caso não tenha, cuidaremos dela e ficaremos apenas com um filhote, os outros, assim como ela, daremos para quem quiser. Estamos entendidos?

-Iiiiiiiiuuuuupiiiii!!!- gritaram os jovens em uníssono, pulando de alegria.

***

-É uma cadela muito resistente.- começou a falar o veterinário, o Dr. Jaime, para o Sr. Otávio, depois de examinar a cadela, que estava deitada num leito na clinica de animais.           –Só está com uma pata quebrada e alguns arranhões mesmo. Nada de mais. Mas não sei de que raça é. Acho que seja uma grande mistura de progênies.

-Que bom que ela está bem. E quanto aos filhotes?- perguntou o Sr. Otávio, afanando com uma das mãos o pêlo macio da cabeça da cadela, que agora era dócil.

-Não se preocupe com eles. Estão vivos. Creio que vão nascer sem problemas. Agora pode levá-la para casa. Ela precisa de repouso. Vai dar a luz dentro de alguns dias.- concluiu o Dr. Jaime com um belo sorriso, submerso em sua barba branca.

Alguns minutos depois a cadela já estava de volta à casa da família Cortez, num galpão, deitada sobre alguns panos forrados no chão, ao lado da casa, tirando um cochilo.  

O sol já se punha no horizonte. Deixando o fim do dia banhado numa pálida luz amarelada.

-Michele parece nervosa.- comentou a Sra. Emília, sentada à mesa, junto com seu marido e os filhos. Era hora do jantar. –Não pára de olhar pela janela da sala.

-Está olhando para nossa nova hóspede. - comentou o Sr. Otávio, após mastigar e engolir uma boa garfada de comida. –Quer ver se ela se comporta bem.

-Depois que o filhote nascer, Michele terá de ser sua mamãe.- brincou Jessie, depois tomou um longo gole do suco de morango, quase esvaziando o copo.

-Não seja estúpida Jessie.- repreendeu-a Flávio, retirando um pedaço de cebola do bife. –Onde já se viu, uma gata adotar um cachorro.

-Ora Flávio, é diferente, mas isso acontece.- começou a Sra. Emília, limpando a boca com um guardanapo. –Uma vez vi no noticiário que uma cadela deu à luz e morreu, e uma gata amamentou os filhotes.

-Sua mãe tem razão. Também vi essa reportagem. Que coisa, não?- concordou o Sr. Otávio, terminando sua refeição.

Depois do jantar, os jovens foram para seus quartos. Como de costume Michele, a gata preta de pêlo macio e brilhante, seguiu Jessie. Ficava ao seu lado em cima da cama. Jessie lia um de seus livros de poesia. Às vezes até recitava o alento que mais gostava para Michele. E a gata parecia entender. Fitava-a enquanto lia.

Já Flávio, em seu quarto, ouvia algumas músicas barulhentas de Rock, enquanto desenhava seus super-heróis favoritos.

Sr. e Sra. Cortez assistiam a uma novela romântica na sala.

-Aúúúú!!!- de repente um uivo triste ecoou pela casa. O uivo vinha do galpão.

 

 

Capítulo 3

 

-Será que nossa hóspede vai ter filhotes agora?- perguntou a Sra. Emília, olhando para o marido, um tanto excitada.

-Será?- perguntou o Sr. Otávio, levantando-se do sofá. –Vamos lá ver.- Sua esposa levantou-se também do sofá e acompanhou o marido até o galpão.

-A barriga dela parece maior.- comentou a Sra. Emília, depois que o marido acendeu a luz.

-Eu não acho.- discordou o Sr. Otávio, fazendo um carinho na cabeça da cadela, que levantou o focinho e lambeu-lhe a mão, enquanto abanava o grande rabo.

-Parece bem.- disse a Sra. Emília franzindo as sobrancelhas e examinando com olhos a cadela. -Ela comeu toda a comida que dei pra ela. Então vamos entrar que não quero perder a novela.

-Está bem. Vamos.- concordou o Sr. Otávio, apagou a luz e acompanhou sua esposa para dentro do aposento. Sentaram no sofá e continuaram a assistir a novela.

 

***

-Michele?- disse Jessie surpresa, ao levantar-se da cama e não ver a gata no quarto como de costume. O sol da manhã entrava pelo vidro da janela, iluminando todo o quarto.

-Pai, mãe, vocês viram a Michele por aí?- perguntou Jessie, enquanto seus pais ainda estavam se levantando da cama. –Não quero que ela saia de casa. Pode arrumar uma briga com aquela cadela.

-Não. Ela não veio aqui.- disse o Sr. Otávio, passando a mão pelo rosto e espreguiçando-se.

-Dê uma olhada no quarto do seu irmão. Talvez ela esteja lá.- disse a Sra. Emília, ainda com cara de sono.

-Não se preocupe filha.- disse o Sr. Otávio, acompanhando a garota até a porta do quarto. –Michele é esperta, não vai chegar perto daquela cadela enorme. Sabe que estaria em desvantagem.

Jessie foi ao quarto do irmão e bateu com força na porta, que estava trancada. Depois gritou: -Flávio. Flávio. Acorde, seu preguiçoso.

-O que você quer? Perguntou o irmão com uma voz esganiçada, ainda sem se levantar da cama.

-A Michele tá aí?- perguntou Jessie, parada frente à porta.

-Não. Sabe que não deixo aquela gata estúpida entrar no meu quarto.- gritou Flávio. –Agora me deixa dormir em paz.

Preocupada, Jessie saiu da casa e foi até o galpão, chamando por Michele enquanto andava. Nada. Nem sinal da gata. Mas de repente viu uma mancha de sangue no chão, ao entrar no galpão.

–Sangue?!- murmurou ela, um pouco assustada. –Se aquela cadela tiver feito algo a Michele, eu a mato.

No final do galpão, a cadela continuava deitada. Com as costas viradas para Jessie. Não se mexia. Parecia não notar a presença da garota. Ou talvez a ignorara.

-Que bagunça.- disse Jessie, olhando alguns baldes e caixas de papelão espalhadas pelo chão. –Cachorros fazem mesmo muita bagunça. Olhe só pra isto.

-Aaaaaahhhhh!!!- o grito de horror escapou de repente da garganta de Jessie, enquanto ela olhava, incrédula, atrás de uma das caixas de papelão a cabeça decepada de sua gata de estimação.

 

Capítulo 4

 

Horrorizada, a garota apanhou do chão uma barra de ferro e correu para a cadela, que continuava deitada do mesmo jeito, sem se mover.

“Vou matá-la!” Pensou Jessie, se sentindo apavorada. “Ela matou minha gata.”

Mas  quando se aproximou mais da cadela, viu porque ela não se movia. Estava morta.

-Oh!- exclamou Jessie, sentido o estômago embrulhar. Havia um enorme buraco na barriga da cadela. Seu sangue coagulante se espalhava pelos panos forrados no chão. Suas tripas lhe saíam para fora. Não havia nenhum sinal dos seus filhotes. Apenas mais uma cena de horror.

Trêmula, sentindo um arrepio gelado lhe percorrer todo o corpo, Jessie deu um passo para trás. Tentando se afastar daquela cena horrível. Lutando para conseguir gritar o nome dos pais. Sentindo sua mão doer, de tão forte que apertava a barra de ferro, que apanhara do chão.

De repente um ruído de algo se mexendo dentro de uma caixa despertou sua atenção. Ela olhou para a caixa no outro canto do galpão e uma coisa negra se movendo no interior da caixa de papelão, um pouco rasgada.

-Meu Deus! Mas o que aconteceu por aqui?- perguntou o Sr. Otávio, entrando no galpão e vendo os pedaços da gata espalhados pelo chão.

-Tem alguma coisa dentro daquela caixa!- disse Jessie num murmúrio, sem que seus pais a escutassem.

-Não pode ser...- lamentou-se a Sra. Emília. -Então aquela cadela matou nossa gata?

-Olhem!!- conseguiu gritar Jessie, ainda com os olhos pregados na direção da caixa do outro lado do galpão. –Tem alguma coisa se mexendo dentro daquela caixa. E esta maldita cadela está morta.

-Mas como?- questionou o Sr. Otávio impacientemente. Depois andou até a cadela e viu com horror o seu estado, com a barriga rasgada e o sangue coagulante.

Mais um ruído e a caixa virou-se de lado. Otávio e Emília voltaram de uma só vez o olhar para a caixa, e viram 3 cabeças de cães surgirem por um buraco na caixa de papelão.

-São os filhotes.- disse Emília se aproximando da caixa. –Parecem enormes.- concluiu. E realmente pareciam ser grandes pelas cabeças, do tamanho de bolas de handebol. E eles só nasceram a poucas horas, certamente no meio da madrugada.

Abaixando-se, a Sra. Emília retirou a caixa de cima dos cachorrinhos e ficou boquiaberta com o que seus olhos contemplavam. Debaixo da grande caixa de papelão não havia vários cachorros, apenas um com três cabeças.

 

Capítulo 5

 

-Mas o que é isso?- perguntou a Sra. Emília, toda confusa. –Parece que é um cachorro com três cabeças.

-Que aberração.- murmurou Jessie, aproximando-se do estranho cão. –Deve ter sido ele quem matou a Michele. É um monstro.

-Acalme-se Jessie.- disse o Sr. Otávio tranquilamente. Abaixou e pegou o estranho cachorro de três cabeças, todas as faces estavam vivas, que o olhavam com os grandes olhos vermelhos. As três cabeças eram cobertas por pêlos negros, macios e brilhantes. –É muito grande.- comentou o Sr. Otávio, erguendo ainda mais o cachorro, de uns 30 centímetros  de altura e uns 50 centímetros de comprimento.

-É macho ou fêmea?- perguntou a Sra. Emília com ar curioso.

-É macho.- disse o Sr. Otávio após examiná-lo. –Será que vai sobreviver? Digo, normalmente esses animais que nascem com mais de uma cabeça acabam morrendo muito rápido.

-Espero que ele morra.- gritou Jessie, saindo as pressas do galpão. –Essa aberração matou a Michele.

-Parece inofensivo.- disse o Sr. Otávio. –Mas vamos ligar pro Dr. Jaime. Ele precisa examinar este cãozinho e sua mãe. É uma pena que Michele tenha morrido.

-Pretende ficar com esse cachorro?- perguntou a Sra. Emília. –Lembro-me que você disse que só ficaria com um. E esse aí são três em um. O que você me diz?

-Gostei dele. É diferente e fascinante.- disse o Sr. Otávio em resposta, deixando o galpão, com sua esposa o seguindo. –O Flávio precisa vê-lo. Acho que também vai gostar.                                    

Alguns minutos depois do Sr. Otávio ligar para o Dr. Jaime, Flávio se encantava com o estranho cão negro de três cabeças.

-Flaaashh!!- o ruído foi emitido da câmera fotográfica de Flávio, enquanto ele fotografava o cachorro. Em seguida saía por um compartimento a foto tirada.

-Que demais!- gritou Flávio, olhando para a foto em sua mão. –Uma bela foto.

-Já pensou em um nome para ele?- perguntou a Sra. Emília, que estava atrás deles, sentada no sofá da sala.

-Vou chamá-lo de Gigante.- disse Flávio. – E aí, Gigante? Como vai Gigante?- o cachorro abanava a calda, enquanto suas três cabeças tentavam morder a mão de Flávio, que agitava-se no ar.

-É um bom nome.- disse o Sr. Otávio. –Tem haver com ele.

Em seguida ouviram o barulho da campainha ecoar pela casa.

-Deve ser o Dr. Jaime.- disse o Sr. Otávio, indo atender a porta.

Ele cumprimentou o veterinário e o convidou a entrar na casa.

-Que cachorrão hein?- disse o Dr. Jaime, erguendo o cão com as duas mãos. –Parece bem saudável. Creio que viverá normalmente com as três cabeças.

-Agora Dr., me acompanhe até o galpão.- disse o Sr. Otávio. –Precisa ver como ficou a cadela.- em seguida foi para o galpão, com o Dr. O seguindo.

-Pobre gatinha, hein?- lamentou-se o Dr., ao passar pelos restos do felino ainda espalhados pelo chão. –Não creio que o filhote a tenha matado. Apesar do tamanho ainda é um recém-nascido. Michele era uma gata esperta. Talvez a cadela a tenha matado. Sabe como as cadelas costumam ficar violentas na hora de dar a luz.- o Dr. Aproximou-se da cadela e a examinou, usando uma luva branca e disse: -Humm... É estranho. Mais parece que o filhote rasgou sua barriga por dentro para conseguir sair. Mas de qualquer forma, não há mais nada que podemos fazer, não é?

O Sr. Otávio deu uma coçada na parte de trás da cabeça e disse:

-Tem razão. Vamos ficar com o filhote e, quanto à cadela e a gata, vamos enterrá-las. Obrigado por vir Dr. Jaime.

Após o Sr. Otávio enterrar os dois animais mortos numa floresta a poucos metros de sua casa, ele voltou. Era por volta das quatro horas. Uma tarde agradável. Num céu sem nuvens, o sol brilhava radiante. Ele planejava passar aquele dia ensolarado no clube com sua esposa e filhos, mas os trágicos acontecimentos mudaram seus planos.

Jessie continuava em seu quarto, com os olhos vermelhos. Ela chorara bastante por ter perdido sua gata. A felina que ela tanto gostava. Mas Flávio não gostava muito de gatos, nem se importara com a morte de Michele. Também ele não teve o desprazer de encontrar a cabeça do animal decepada do corpo, ou os seus pedaços espalhados pelo galpão. Ele ficou a brincar com Gigante, que aparentava ser manso.

 

***

 

-Mas pai...- protestou Flávio, após o jantar, estava na sala, com o pai e Gigante. –Por que Gigante não pode dormir dentro de casa?

-Cachorros costumam fazer muita bagunça.- começou o Sr. Otávio, pegando Gigante nos braços. -Se o deixarmos dormir aqui essa noite, vai acostumar. E vai começar a morder tudo que encontrar pela frente. Sapatos, chinelos, roupas, revistas, etc.

-Mas...- Flávio ia protestar novamente, mas o pai o interrompeu.

-Está decidido. Gigante dorme lá fora, no galpão.- concluiu o Sr. Otávio, depois levou o filhote pra o galpão. Lá o deitou em alguns panos forrados no chão. –Fique aí e não faça bagunça.- disse ele ao cão, depois apagou a luz do galpão e entrou na casa.

No outro dia, a Sra. Emília foi a primeira a acordar, levantou-se da cama e foi ao banheiro. Era umas seis da manhã. Ela era secretária numa clínica dentária, pegava serviço às sete da manhã. Após escovar os dentes foi para a cozinha preparar o café da manhã. Segundos depois, Jessie e Flávio também acordavam. Ambos estudavam no mesmo colégio, no turno da manhã. O Sr. Otávio costumava a acordar mais tarde, era gerente de administração numa empresa de eletrodoméstico fora da pequena cidade onde mora. Pegava serviço às nove da manhã, por isso era sempre o último a acordar.

Após tomarem o café da manhã, Flávio encheu uma vasilha com leite e cereais e foi levá-la para Gigante. “Ele deve estar faminto.” Pensou, entrando no galpão e se surpreendendo.

 O galpão estava revirado. Caixas espalhadas e rasgadas se estendiam pelo chão a fora. Jornais velhos também despedaçados se espalhavam por toda parte.

–Gigante!- gritou Flávio, olhando cada canto do galpão. –Gigante! Venha cá, Gigante!! Você está encrencado.- Mas nem sinal do cachorro. Flávio saiu do galpão e rodeou a casa, começando pela parte de trás. Nada. Quando retornou pelo outro lado, percebeu que a cerca de madeira pintada de branco, de um tamanho médio, que contornava a casa, tinha uma parte quebrada, com vários pedaços espalhados pelo gramado verde e bem podado e pôde constatar que Gigante havia fugido.

 

 

Capítulo 6

 

-Mas para onde este cachorro pode ter ido?- perguntou o Sr. Otávio, que fora acordado mais cedo, e trabalhava na cerca, arrumando-a.

-Vou dar uma olhada por aí até chegar ao colégio.- disse Flávio. –Não deve ter ido muito longe.

-Espero que não volte mais.- murmurou Jessie maldosamente, dando um empurrão no irmão. –É um cachorro muito feio.

-Feia é você. Sua boba.- gritou Flávio fazendo uma careta para a irmã.

-Não comecem a brigar.- repreendeu-os a Sr. Emília, saindo da casa. Deu um beijo rápido na boca do marido e acompanhou os filhos até a calçada. –Agora vão pro colégio. Vão ter a tarde toda pra procurar o cãozinho. Isso se ele não voltar antes. Agora deixa eu ir senão chego atrasada no serviço.- Rapidamente ela atravessou a rua e desapareceu ao cruzar uma esquina próxima.  Os jovens se despediram do pai e seguiram o caminho do colégio.

“Gigante é muito forte. Com menos de dois dias de nascido ele já consegue quebrar uma cerca de madeira. É realmente surpreendente.” Pensou o Sr. Otávio.

Algumas horas depois das aulas, Flávio voltava pra casa, acompanhado de Edgard, colega de classe. Era um garoto gordo, de cabelo liso e louro, a pele muito clara. Suas bochechas gordas iam ficando coradas à medida que andava sob o radiante sol do fim da manhã.

-Não vejo a hora de ver esse seu cão de três cabeças pessoalmente.- disse Edgard, olhando arduamente para a foto do cão que segurava em sua mão.

-Vamos procurá-lo na floresta.- disse Flávio excitado. –Já perguntei pra um monte de gente e ninguém o viu. Ele só pode estar na floresta.

-Eu vou até lá com você, mas não posso demorar, senão me atraso pro almoço.- disse Edgard, depois entregou a foto para o amigo.

-Flávio.

-O que é?

-Quando dá comida para seu cão, ele come com as três cabeças?

-Sim. É uma bagunça. Como só coloco uma tigela com comida, cada hora uma das cabeças querem comer. É muito engraçado.- concluiu Flávio, dando uma boa risada. Depois seguiram o caminho em silêncio. Olhando atentos para os lados, à procura de Gigante. Pouco depois já estavam na orla da floresta.

-Está bastante quente por aqui.- comentou Edgard limpando o suor da testa com a manga da camisa do uniforme do colégio.

-O ar aqui é tão úmido.- disse Flávio, enquanto ia guiando o caminho por uma trilha de terra estreita, que os conduziam floresta adentro. Árvores e galhos, aos montes, levavam a trilha, que ia fazendo várias curvas, para ambos os lados.

-Gigante! Gigante!- iam gritando os dois garotos à medida que se aprofundavam na floresta, onde os raios solares custavam a entrar. Mal se podia ver o céu. Os galhos e folhas das inúmeras árvores formavam uma copa muito fechada.  

-Oh! Que nojo!- gritou Flávio, olhando para a pequena cabeça degolada de um pássaro sobre uma poça de sangue ainda fresco, no chão.

-O que é que encontrou?- perguntou Edgard, apressando-se para aproximar-se do amigo.

-A cabeça de um grande pássaro e uma poça de sangue.- respondeu Flávio, fazendo uma careta de nojo.

-Credo. Nem quero ver.- disse Edgard, desistindo se aproximar do amigo. –Acho que seu cão não está por aqui. É melhor voltarmos. Estou faminto.

Mas antes que Flávio pudesse dizer alguma coisa, escutou um rosnar furioso. Olhou mais adiante e viu um grande vulto negro correr atrás de um animal.

 

 

Capítulo 7

 

–Que animal rugiria dessa maneira tão assustadora?- perguntou Edgard, sentindo um calafrio lhe percorrer a nuca.

-Você viu?- perguntou Flávio impaciente. –Gigante saiu correndo atrás de algum outro animal.

-Então foi seu cão que rosnou daquela maneira?- Perguntou Edgard assustado. Mas Flávio deu de ombros.

–Não sei.- disse rapidamente. –Precisamos correr. Ele está na floresta.- gritou Flávio. “O vulto que vi era Gigante.” Pensou enquanto andava mais apressado. “Mas parecia tão maior. Será?”

Depois de alguns minutos, andando e gritando por Gigante, sem encontrá-lo, os garotos sobem uma pequena trilha e viram uma mão sobre um tronco deitado.

-Veja tem alguém deitado atrás do tronco.- comentou Flávio. –Quem deve ser, hein?

-Algum bêbado talvez.- sugeriu Edgard, com a respiração ofegante e o rosto banhado em suor. A caminhada acabara com ele.

Mas quando os garotos se aproximaram silenciosamente do tronco deitado, viram com horror que a mão estava separada do corpo, que estava há alguns centímetros de distância, banhado em sangue, todo despedaçado, e com várias marcas de mordidas pelos poucos pedaços de carne que ainda estavam junto ao esqueleto humano.

 

 

Capítulo 8

 

-Você disse que viu o seu cachorro, não foi?- perguntou Edgard, enquanto se apressava seguindo o caminho de volta, rezando para conseguirem sair logo da floresta. –Será que ele...

-Não.- interrompeu Flávio, que ia guiando o caminho, um pouco mais à frente. –Gigante é só um filhote. Além de tudo é muito dócil. Não seria capaz de matar um homem.

-Mas Flávio...- esforço-se para falar Edgard, com a respiração ofegante, e o coração aos pulos dentro do peito. –Você disse que viu seu cão perseguir algum animal, e ele não é um cão comum. Têm três cabeças.

-Vamos até a delegacia e contar pro xerife Carlos, apenas sobre o corpo que encontramos. Nada de dizer que Gigante pode tê-lo matado.- disse Flávio, quase tropeçando numa raiz de árvore atravessada sobre o chão, andou cambaleando e depois recuperou o equilíbrio.

-Está bem.- disse Edgard, já alcançando o amigo na orla da floresta. –Mas não é comum encontrar corpos despedaçados na floresta. É uma floresta inofensiva, lembra-se?

Os dois garotos ganharam a rua e seguiram até a delegacia, que ficava a alguns metros da floresta.

Mas pensamentos sinistros não saíam da cabeça de Flávio. “Gigante estava enorme. Será que me enganei? Poderia ser outro animal?”

Eles chegaram à delegacia e contaram sobre o corpo que encontraram na floresta. O xerife Carlos reuniu uma equipe e partiu para o bosque, alertando a ambulância que fosse para lá imediatamente, seguindo o caminho indicado pelos garotos. E lá os policiais encontraram o corpo.

-Minha nossa!!- lamentou-se o xerife. –Este é o corpo de Rufos, o fazendeiro. Quem ou o que pode tê-lo matado desta forma horrível?

-Xerife.- gritou Watson, um dos quatro policiais que estavam ali. – Venha aqui dar uma olhada.-

O xerife se afastou do corpo e seguiu até onde Watson estava.

-Minha nossa!- exclamou surpreso o xerife, ao ver uma grande marca de pegada, numa parte de terra úmida. –Parece pegada de cachorro. Mas é absurdamente maior.

-Talvez seja essa criatura quem matou Rufos.- deduziu Watson, pensativo.

-Nem brinque com isso.- disse o xerife seriamente. –Mas vamos investigar cuidadosamente quem ou o que matou Rufos desta maneira.

Segundos depois o pessoal da ambulância chegava, carregando uma padiola nas mãos. Cuidadosamente foram colocando os pedaços do corpo na padiola. Depois seguiram o caminho de volta, até a orla da floresta, onde estava a ambulância. Os policiais, depois de darem algumas vasculhadas pela floresta, sem encontrar muitas pistas, senão as grandes pegadas espalhadas pelos caminhos, retornam à delegacia.

Depois de muito hesitar, Flávio decidiu contar ao pai sobre o corpo despedaçado que encontrara na floresta e sobre Gigante, que parecia estar bem maior.

-É muito estranho.- começou o Sr. Otávio. –O metabolismo desse cão pode fazê-lo crescer rapidamente, não sei, só sei que ele pode estar por trás desse assassinato. Vou ligar pro xerife e contar isso a ele.

-Mas pai...- protestou Flávio, enquanto o pai tirava o telefone do gancho. –Se contar isso pro xerife, eles vão matar o Gigante.

-Se o seu cão for um assassino, terá de ser sacrificado.- disse o pai enquanto discava para o xerife. –Agora fique quieto.

-Delegacia de polícia, o que deseja?- disse uma voz feminina do outro lado da linha.

-Olá, Lourdes. Aqui é Otávio. Preciso urgentemente falar com o xerife. É sobre o assassinato que aconteceu na floresta.- concluiu rapidamente.

-Otávio, o xerife não está no momento, ele foi justamente para a floresta investigar o caso, mas vou passar o seu recado para ele, ok?- disse Lourdes, falando meio depressa. 

-Está bem. Vou ficar aguardando o xerife. Obrigado.- em seguida desligou o telefone, e viu a esposa surgir na porta da cozinha, usando um avental branco. Estava a preparar um bolo.

-Falou com o xerife?- perguntou a Sr. Emília, ainda parada na porta da cozinha, olhando para o marido, que estava sentado no sofá na sala.

-Não. Ele não está na delegacia.- disse o Sr. Otávio. –Mas deixei o recado para ele passar aqui.

-Acha mesmo que foi Gigante quem matou o homem lá na floresta?- perguntou a Sra. Emília, franzindo as sobrancelhas e mordendo os lábios inferiores. Sempre fazia isso quando estava preocupada.

O Sr. Otávio deu de ombros e disse:

-Não sei. Flávio disse que o vira na floresta, e estava bem maior. Mas não podemos tirar conclusões precipitadas.

-Não foi o Gigante.- murmurou Flávio, carrancudo, sentado na outra extremidade do sofá.

-Aquele cão-aberração é um assassino.- Provocou Jessie, que surgiu na sala naquele momento. –Um assassino maldito.

 

 

Capítulo 9

 

Meia-hora depois o xerife chegava à casa da família Cortez. Era por volta das seis horas da tarde. Não se via o pôr-do-sol. No céu, pairavam grossas nuvens acinzentadas, que deixava o ar umedecido.

-Lourdes me disse que você queria me dizer algo sobre o assassinato que acontecera hoje na floresta.- disse o xerife, sentando no sofá da sala, junto ao Sr. e Sra. Cortez e os dois jovens. –Então, deixei meus homens na floresta e vim o mais rápido que pude.

-Sábado, quando voltávamos de um clube, acabei atropelando uma cadela...- começou o Sr. Otávio. -A socorri. Estava viva, só com uma pata quebrada. E esta cadela estava grávida. Então decidi trazê-la para cá. Levei-a no veterinário e tudo estava bem. Iria esperar que ela ganhasse filhotes ou que seu dono aparecesse, para devolvê-la. Mas durante a noite ela ganhou apenas um filhote.

-O que está tentando me dizer, afinal?- perguntou impaciente o xerife, interrompendo o Sr. Otávio.

-Está bem. Vou direto ao ponto. Esta cadela pariu este cachorro.- disse entregando uma foto ao xerife, que a olhou com espanto. –E este filhote enorme, ao que tudo indica, trucidou nossa gata. E Flávio o avistou perseguindo algum animal na floresta, e disse que ele estava bem maior.

-Eu não acredito no que estou vendo.- disse o xerife num fio de voz, enquanto permanecia com os olhos pregados na fotografia. –Este cão parece...- mas antes que o xerife pudesse concluir sua frase, teve de atender seu radio transmissor. –Prossiga para o xerife.

-Carlos aqui é Lourdes.

-O que é, Lourdes? Alguma emergência?

-Sim. Watson entrou em contato e disse que foram surpreendidos por uma fera gigante de três cabeças.

-Oh! Meu Deus! E eles, estão bem?

-Negativo xerife. Todos os policiais foram mortos.

-E Watson? Onde ele está?

-Não sei. Depois que ele me avisou sobre as mortes, começou a gritar e perdi contato. Sinto muito.

O xerife simplesmente abaixou o rádio transmissor, voltando o olhar aterrorizado para a foto que ainda segurava na mão.

-Na mitologia grega, há um cão de três cabeças que guarda o inferno.- começou a dizer o xerife, enquanto os demais o escutavam num silêncio fúnebre. –Dizem que ele se alimenta de almas e cresce de maneira assustadora. Eu não entendo como nem porque, o cão do inferno renasceu na Terra e veio aterrorizar esta pequena cidade. Isso é terrível. E meus homens estão... mortos!

-Me desculpe Carlos, mas eu não acredito nessas historias de mitologia ou de renascimento, o fato é que temos uma fera de três cabeças, que cresce rapidamente, e que mata as pessoas. O que vamos fazer? Você é o xerife, diga-nos o que devemos fazer.- disse o Sr. Otávio, segurando firmemente as mãos de sua esposa.

-Li muito sobre mitologia, e agora que surge esse cão assassino de três cabeças, quer que eu pense o quê? É muita coincidência.- disse o xerife nervosamente, fez uma pausa olhando arduamente para a foto e continuou. –Vou pedir reforços, eles vão demorar algumas horas para chegarem aqui, enquanto isso não saiam de casa. Caso o cão apareça me liguem, que venho rapidamente e trago todas as armas possíveis.

O xerife saiu da casa e entrou em sua viatura e seguiu para a delegacia.

A família Cortez ficou em silêncio. Expressões de preocupação e medo estampados nos rostos de cada um.

 

 

Capítulo 10

 

Algumas horas depois, todos tentavam dormir. Até que apenas o Sr. Otávio permanecia acordado. Com mil pensamentos assustadores lhe passando à cabeça. “O cão se transformara num demônio. Se não tivesse fugido, talvez nós é que estaríamos mortos agora.” Pensamentos que se amontoavam uns sobre os outros. “Como vamos detê-lo?” 

De repente um forte barulho estremeceu o corpo do Sr. Otávio.

“Mas que diabos foi isso?” Perguntou-se assustado, levantando-se da cama e indo até a janela do quarto. A Sra.Emília também despertou e aproximou-se do marido, em silêncio.

–O que foi isso?- perguntou ela num sussurro. Mas o Sr. Otávio não respondeu, ficou pálido ao ver um grande pedaço da cerca de madeira que cercava a casa feita em pedaços. Em seguida ouviram pancadas violentas na porta da rua. –O que é isso?- perguntou a Sra. Emília com uma voz falhada e rouca. O terror a dominava.

Silêncio. As batidas pararam. E de repente passos firmes começam a rodearem a casa.

-Ahh!- gritou a Sra. Emília assustada.

-O que foi?- perguntou o Sr. Otávio num murmúrio, detendo-se na porta do quarto.

-Eu o vi passar pela janela.- disse sua esposa com a voz trêmula pelo terror. –É o Gigante. Ele está dez vezes maior. Vai nos matar.- lágrimas geladas começaram a escorrer por sua face pálida pelo assombro.

Eles foram até os quartos dos filhos e os acordaram.

-Temos de pegar o carro e sair daqui.- disse nervosamente o Sr. Otávio, vestindo um jeans por cima do pijama e pegando as chaves do carro. -Vou ligar para o xerife primeiro.- sentou-se no sofá da sala e pegou o telefone. Quando começou a discar, viu com horror a porta da rua, a sua frente, ser feita em mil pedaços, formando várias rachaduras na parede. –Oh! Não pode ser...- conseguiu gritar, largando o telefone, que caiu no chão e viu o enorme cão surgir em seus umbrais e fitá-lo  diabolicamente com suas três enormes cabeças, que agora estavam do tamanho de rodas de caminhão.

A gigante fera enlouquecida lutava para adentrar o aposento.

 

 

Capítulo 11

 

-Ela vai entrar!!- disse o Sr. Otávio, levantando-se do sofá e se aproximando da esposa e dos filhos, que estavam na entrada do corredor que dava para os outros cômodos da casa. –Rápido, vamos dar a volta pela lateral da casa, pulando a janela do nosso quarto.

O enorme cão, que rugia e ia forçando a parede a ceder, não tirava os olhos das assustadas pessoas que estavam na casa.

-Vamos.- gritou o Sr. Otávio, no preciso momento que a parede da frente da casa veio a baixo e o cão preparava para invadir. Eles foram rápidos, entraram no quarto e o Sr. Otávio trancou a porta, enquanto a Sra. Emília ia abrindo a janela, que dava pro galpão, onde estava o carro.

Pancadas ferozes tentavam arrombar a porta do quarto. Ouvia-se os rugidos apavorantes do cão do outro lado, tentando entrar a qualquer custo.

-Rápido!- disse o Sr. Otávio, enquanto os filhos pulavam a janela, e depois foi a vez da Sr. Emília e, com certa dificuldade por causa do peso, o Sr. Otávio.

Entraram todos no carro e quando o Sr. Otávio o ligou, olharam para a direita, para a janela do quarto, e após um forte barulho da porta se despedaçando, viram o enorme cão olhando para eles pela janela aberta. O Sr. Otávio pisou fundo no acelerador, fazendo os pneus do carro derraparem ruidosamente sobre o solo de concreto do galpão. O carro passou por cima da cerca baixa de madeira, destruindo-a. Em seguida ganhou a rua.

-Para onde vamos, pai?- perguntaram as crianças em uníssono. Ambas iam sentadas no banco de trás do carro.

-Para a delegacia.- apressou-se a lhes responder o Sr. Otávio, que ia ao volante, ao lado da esposa.

O carro seguia pelas ruas silenciadas pelo terror. Corpos despedaçados jaziam espalhados por todos os lados. Gigante os matara. O cão de guarda do inferno, como uma nuvem negra de maldade, espalhara o terror por todos os lados. Alguns poucos minutos depois, o carro da Família Cortez chegava à delegacia. Sem dizer nada, todos os quatro desceram do carro e entraram na pequena e única delegacia da cidade. Andaram por um pequeno corredor e avistaram o xerife em sua sala, preparando várias armas, que estavam sobre a mesa.

-Xerife.- disse o Sr. Otávio surpreendendo-o.

-Otávio!?- Falou o xerife com uma voz rouca. –O que fazem aqui? Não lhes disse para ficarem em casa?

-Carlos, o maldito cão destruiu minha casa, se não saíssemos às pressas ele nos mataria.- disse o Sr. Otávio aproximando-se do xerife. –Você não viu como está lá fora? As ruas estão cobertas de sangue. Há corpos humanos por todos os lados.

-Lourdes me disse.- começou o xerife com uma expressão desorientada. –O telefone não pára de tocar. O cão está matando a todos. Já pedi reforços. Vão levar algum tempo até chegarem aqui. Essas armas são tudo que temos. Vocês me ajudam a encontrar esse maldito cão?

-Pode contar com a gente.- disse Jessie furiosa. –Quero esse cão morto. Ele matou minha gata de estimação. Dê-me uma boa arma que eu...

-Não.- disse o xerife, interrompendo-a . –Nem você nem seu irmão podem usar armas de fogo. É muito perigoso.

-O xerife tem razão.- Concordou a Sra. Emília.

Pouco depois o xerife, O Sr. e Sra. Cortez e os filhos saiam dentro da viatura policial, em busca de Cérbero, o cão de guarda do inferno. Passando pelas ruas sangrentas. Uma guerra parecia ter acontecido naquela cidade.

-É ele.- disse a Sra. Emília, apontando para a frente. Ela e as crianças iam no banco de trás, o xerife ao volante e o Sr. Otávio ao seu lado. –É Gigante.

 

 

Capítulo 12

 

Todos fixaram o olhar numa grande mancha preta que se movia, no final da rua, aumentando de tamanho a medida em que ia se aproximando do carro, que ia muito devagar. O xerife desceu do carro junto com o Sr. Otávio e ordenou:

-Emília, fique na direção do carro, Otávio e eu tentaremos deter o animal. Caso não consigamos o deter, entramos no carro e você o acelera, ok?

-Entendido.- disse ela pegando a direção e ficando atenta.

De repente, quando o animal estava na mira, abriram fogo impiedosamente. Mas o cão continuava a avançar, sendo atingido várias vezes. Seus rugidos apavorantes iam aumentando à media que ele se aproximava, em alta velocidade.

-Droga. Mesmo ferido ele continua vindo.- gritou o xerife. –Precisamos entrar no carro ou ele vai nos matar.- cessaram fogo e entraram os dois no carro. O xerife sentou no banco de trás, junto com as crianças e o Sr. Otávio se sentou no banco da frente, ao lado da esposa, que pisou fundo no acelerador. O carro cantou pneu no asfalto e começou a ganhar velocidade. Mas o cão o seguia, aproximado-se numa velocidade espantosa. Depois ficou para trás.

O carro estava indo muito depressa, e antes que a Sra. Emília pudesse diminuir a velocidade, o carro derrapou ruidosamente numa curva e saiu da estrada, descendo até a orla da floresta. Ela pisou com força no freio, mas o carro acabou batendo numa grossa árvore.

A frente do veículo ficou arruinada, apesar da violência da pancada todos pareciam bem.

-Essa foi por pouco.- disse o xerife num suspiro. –Precisamos sair do carro, ele pode pegar fogo a qualquer momento. Aquela fera deve estar vindo até nós.

Todos saíram do veículo. O xerife foi até a beira da estrada e sentiu seus olhos encherem de terror.

-E aí xerife?- perguntou o Sr. Otávio, ainda na orla da floresta, abraçado com sua mulher e filhos. –O cão está vindo? Consegue vê-lo?

Sem responder o xerife correu até eles atônito, parou e disse numa voz esganiçada:

-Está vindo. Ele está vindo velozmente.

-Vamos entrar na floresta.- sugeriu o Sr. Otávio com os olhos apavorados.

-Ele vai nos achar.- choramingou a Sra. Emília, enquanto apertava firme as mãos das crianças.

-Vamos entrar na floresta.- gritou o xerife, trilhando o caminho estreito. –Tenho uma idéia para devolver o cão ao inferno.- neste instante um brilho de esperança, e ao mesmo tempo diabólico tomou os olhos do xerife.

 

 

Capítulo 13

 

Segundos depois, os jovens Flávio e Jesse, se encontraram em cima de imponentes árvores, e atrás destas, o xerife Carlos, e o sr. e sra. Cortez, todos armados, mergulhados em sombras, dominados pelo silêncio, esperam pelo maldito cão do inferno.

A espera é agonizante. Mas ele, o terrível cão do inferno já está na floresta, farejando o rastro de suas débeis presas.

O mal caminha lentamente. Suas três bestiais cabeças oscilam a procura de suas próximas refeições. O ruidoso e surdo barulho de galhos secos se quebrando por enormes patas começou a ser ouvido cada vez mais perto. Mais alto. Mais apavorante, assim como os barulhos de suas respirações ofegantes.

-É agora.- falou o xerife num murmúrio surdo para seus companheiros, escondidos atrás de três outras árvores.

O cão, lenta e sorrateiramente se aproxima da armadilha. Pára alguns metros das três árvores, com suas três cabeças farejando intensamente o ar úmido.

Então, com um salto violento, latindo e rosnando ameaçadoramente, a fera saltou para a árvore onde estava Flávio. A árvore estremeceu e o pobre garoto caiu violentamente no chão.

 

 

Capítulo 14

 

O cão se virou para o garoto caído há alguns metros, se preparou para atacá-lo quando inúmeros tiros o fuzilam.

O cão se vira para os três atiradores, rugindo ferozmente, mas os tiros não param. Perfuram sua carne. Atingem o seu coração. Fazendo se formar uma enorme poça de sangue à sua volta. Sem forças para contra-atacar o enorme e bestial cão tomba contra o solo.

De suas três bocas, um gemido de timbre aterrador, ecoa por toda a floresta por breves momentos. Depois o silêncio mórbido e melancólico reina soberano.

-Flávio, você está bem?- pergunta o Sr. e Sra. Cortez, em uníssono.

-Sim. Estou bem. O solo da floresta está úmido, amorteceu minha queda. Tenho sorte.- respondeu Flávio forçando um sorriso.

-E-Está morto!- diz o xerife num sussurro. Sua expressão triste revela-se aliviada.

-O que vamos fazer com ele?- pergunta o Sr. Otávio, enquanto seus olhos percorrem pelo gigantesco corpo do animal caído.

-Vamos enterrá-lo.- disse o xerife em resposta. –Vamos devolver este demônio repulsivo ao inferno, de onde jamais deveria ter saído.

-Vou ter de reconstruir algumas paredes lá em casa que este animal destruiu.- começou o Sr. Otávio, enquanto coçava o queixo com uma das mãos. –Mas vou me sentir bem se o ajudar a enterrar esta coisa maligna.

Ainda de noite, eles abriram uma profunda e larga cova e nela enterraram o cão do inferno.

-Dizem que o mal nunca dorme...- começou a dizer o Sr. Otávio numa voz sumida, após tamparem o túmulo do cão. –Dizem que não se pode destruir o mal, aprisioná-lo ou fugir dele. O mal pode ser ferido, apenas isso. Nunca destruído. Dizem que se você conseguir ferir o mal, ele irá, não para sempre, apenas por um tempo, um tempo que pode ser curto como uma felicidade ou longo como um pesadelo, e neste tempo incerto como o amanhã, o mal irá se recuperar, e esperar... ...ESPERAR é exatamente o que o mal faz. Esperar o momento certo de se vingar.

As palavras obscuras e assombrosas do Sr. Otávio continuaram a pairar sobre a família Cortez como uma densa nuvem negra de ódio e fúria. Mas eram apenas palavras de um homem que confrontou o seu pior pesadelo. Ele mesmo não sabia porque as tinha dito.

***

O xerife voltou para a delegacia. Tinha de esperar os reforços. Havia mais corpos sem vidas espalhados pelas ruas do que túmulos no cemitério para enterrá-los.

A família Cortez voltou para casa. Já eram por volta das três da madrugada.

O Sr. Otávio improvisou compensados nas paredes e na porta da rua que estavam danificados.

“O mal foi enviado de volta ao inferno.”

“O mal foi destruído.”

“O mal nunca mais voltará. Nunca mais.”

“O pesadelo acabou.”

Eram os pensamentos que os forçavam a tentar dormir o resto da noite. Mas o terror havia deixado em cada um deles marcas doloridas.

 

 




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